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domingo, 6 de março de 2011

Devaneio Urbano

             Em uma esquina qualquer, um cara qualquer. Andando pela selva de pedra, vendo a todos; andam apressados em busca da caça. A noite virou dia e o dia virou noite. Frenesi do cotidiano; deixa todos fora de rumo, feito partículas abandonadas no vácuo. Sem um curso certo, eu também ando por aí, de um bar em outro, procurando sanar minhas dúvidas. Tomo minha cerveja e observo. Executivos e outros homens importantes, todos procurando obter de prostitutas àquilo que julgam não ser possível se ter em casa com suas esposas. Pobres tolos; presos em suas ilusões momentâneas, não percebem a série desastrosa de equívocos que até mesmo um homem dotado de algum esclarecimento é capaz de cometer. Mas é o momento. Querem, enfim, apenas prazer; elas o dinheiro. Então, acaba ficando bom para todos. Continuo observando. Policiais reprimem travestis do outro lado da rua. Estranho; um deles é o mesmo que saiu com outro deles noite passada!
            Não entendo mais o mundo. Patrocinamos nossas frustrações, porém, jogamos nossa culpa nos outros. O menino guarda os carros na calçada, mas quase sempre não recebe suas desejadas moedas. Há quem diga que ele está ali porque simplesmente quer. Escolheu ser um vagabundo que pede esmolas. Coitado! Será mesmo? Não teve melhor sorte? Na certa, usará suas moedas para obter um pouco de cola de sapateiro para enganar seu sistema nervoso central e, então, ludibriar seu sofrimento de ser um despossuído. Aos olhos do bacaninha que pegou o carro do papai para impressionar a garota que aceitou sair com ele, este menino é como se fosse lixo. Um resíduo social cuja existência está fadada a excreção.
            Continuo observando. Carros e mais carros, fumaça e muito barulho. Aqui neste bar, alguns de seus condutores encaminham-se para entorpecer seus pensamentos. Acompanham suas bebedeiras muita comida com gordura saturada. Entre eles, alguns meninos e meninas vendem bugigangas. Ninguém as compram. Não sei o que é, mas todos ficam diferentes a noite. É como se pudessem dar vazão ao que não podem ser a luz do dia. Fico pensando. Pergunto-me: por que tanta gente sai à noite? Por que eu mesmo saio de casa? Não tenho uma resposta. Nem sei bem ao certo se um dia terei. Olhando para toda esta gente, vejo que alguns estão por aí buscando uma boa transa, drogas, esquecer-se dos problemas. Falam do trabalho que não gostam, reclamam de seus chefes. Outros apenas querem conversar com os amigos. Há entre estes também os amantes que se camuflam ao cair da noite, exploram seus desejos proibidos.
            Mas outros iguais a mim, simplesmente, andam por ai sem destino certo. Também não gosto de meu emprego. E então, a noite é um bom período ao qual me dou o luxo de proporcionar algumas horas de esquecimento desta vida desgraçada. Olho para algumas mulheres, e até demonstram interesse. Não sei ao certo o que elas veem em alguém como eu. Me desvio cauto. A embriagues, em seu estado avançado, já alterou meus sentidos. E tudo que eu poderia fazer seria chatear com minha conversa de bêbado. Olho o relógio e percebo que a hora de ir para casa se aproxima. Encontro alguns amigos no trajeto. Todos querendo “cair na noite”. Infelizes universitários. Enganam seus pais, mentem que estão se dedicando ao máximo em seus estudos e, à noite, torram a grana que recebem mensalmente para custear suas vidas aqui nesta cidade.
            Chego a minha casa. Com dificuldades tento abrir a porta. Depois de entrar fico refletindo sobre esta que foi mais uma noite e penso no dia que será mais um dia. É estranho! Criamos muitas rotinas tentando fugir daquilo que acreditamos ser uma rotina. O dia virá em algumas horas. Irei para o trabalho. Depois, na certa, tentarei esquecer deles mais uma vez; isso parece não ter fim.

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